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Educação


Por que entreguei minhas aulas



Há anos tenho questionado nosso modelo de ensino. Há tempos vinha fazendo autocrítica à minha prática docente. Eu bolava aulas diferentes, mas a essência do modelo não mudava. Queria fazer alguma coisa inovadora e não conseguia. E mesmo quando conseguia fazer aulas menos monótonas via que jamais conseguiria mudar o sistema sozinho, pois ele dissolve as criatividades isoladas. Criatividade só vinga em ambientes criativos. O estresse por perceber isso e por sentir a impossibilidade de mudar o sistema me consumia.

O modelo engessado que se reduz a aulas de cinquenta minutos, a provas e ao preenchimento de diários, ainda é rotina vista como normal por muitos professores. Porém é algo absurdo, caduco, inconcebível para um mundo atual recheado de aplicativos tecnológicos. Além de ultrapassado, o sistema tem gerado  desperdícios de energias humana e da natureza, com resultados medíocres. Dados do Ideb provam isso.

A cultura escolar cristalizada na cabeça das autoridades que nunca deram uma aula sequer, mas legislam sobre uma realidade que eles não conhecem e a atitude de pais querem seus filhos abarrotados de aulas, são razões diante das quais me sinto vencido. Soma-se a isso a cultura escolar errônea criada na cabeça de professores que se tornam escravos de conteúdos, independente de seu alunos aprenderem. Não deveriam sofrer por não conseguirem esgotar o conteúdo programático da sua disciplina, mas pelo esgotamento do sistema. Há uma  lógica quantitativa perversa no modelo clássico de ensino. As pessoas se abarrotam de informações sem processá-las e nem associa-las e os professores se sentem felizes pelo dever cumprido. Cumprido? Perde-se em extensão e  profundidade, pois a aprendizagem fica na superfície dos fatos. Perde-se em tudo, pois tudo fica à meia boca. Eu não dei mais conta de conviver com essa perspectiva de educação sem entrar em conflitos comigo e com os alunos.

Eles queriam treinar questões e eu queria pesquisa, metodologia científica, a aprendizagem pela problematização (PBL). Não consegui encantá-los com propostas inovadoras e não via saída a não ser me acomodar na chatice das aulas tradicionais, que eles também não queriam mais.  Eles tinham razão. Eu avaliei minha atuação como muito ruim e não via como melhorar. O conflitante é que a aula antiga é detestável, mas,  práticas novas que exigirem dos alunos  a pesquisa , leituras e análises, também são rejeitadas. Porém, não dá mais para assistir ao mundo de camarote, ouvindo aulas. As pessoas sabem disso, mas continuam resistentes a mudanças, pois é cômodo pagar alguém que faça tudo para elas. O sistema criou essa cultura. As concessões o tornaram paternalista e assistencialista e os alunos ficaram mal acostumados, querendo tudo pronto nas mãos. Essa chaga minou o sistema e o esgotou.

A angústia por não saber como fazer, e pela falta de segurança às crescentes violências verbais e físicas dos alunos e a baixa aprendizagem deles,  tem levado professores à hipertensão, à síndrome do pânico e à de burn out . Tenho colegas, ainda novos, tomando rivotril, lexotan,  gardenal, dentre outros, para conseguirem suportar realidade escolar. Isso é educativo?

Eu nunca sofri violências físicas, na minha longa trajetória docente, apenas as verbais. Penso que as gerações passadas não adoeciam tanto os mestres. E, como eu não queria chegar a isso e nem prejudicar meus alunos mais do que já havia feito, resolvi entregar minhas aulas.

Sonho com o dia em que vai ocorrer a união docente e a maioria vai reagir à zona de conforto do sistema clássico de ensino, que a todos aborrece e adoece e vão construir uma realidade em que alunos e professores aprendam o tempo todo nas escolas, mediados pelas tecnologias velhas e novas, mas de forma intensa, profunda, desperdícios e, sobretudo, felizes.



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Escrito por Educação, no dia 23/10/2015




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