Estamos não só infantilizando, como alienando os adolescentes. Escola que se impõe com pretensões de verdades científicas prontas e como instituição inquestionável, impõe também a dependência contra a autonomia intelectual e psicológica dos estudantes.
Já apresentei o nome da Claudia Costin em outros momentos aqui. Tenho grande admiração pela visão lúcida dela ao olhar para a educação e enxergar as limitações do que os professores estão fazendo nas salas de aula e de como e o que deveriam fazer. Vale conferir mais uma contribuição dela. ?Numa visita ao Brasil, pouco depois de sair do Governo da Espanha, Felipe Gonzalez foi questionado sobre o que gostaria de ter feito e não conseguiu. Depois de pensar alguns minutos, disse lamentar que, apesar de avanços importantes em educação, os jovens ainda se formavam e queriam saber o que o Estado faria por eles. Ou seja, eram formados para a dependência, não para a autonomia.
De fato, muitos sistemas educacionais no mundo, e o Brasil não é uma exceção, formam pessoas que demandam trabalho e não consideram a possibilidade de trabalharem de forma independente ou criarem suas próprias organizações. Neste sentido, é promissor ver que, mesmo em tempos de crise, há um crescente número de startups que, criadas por jovens, buscam inclusive aventurar-se em empreendimentos de impacto social relevante.
Não é necessariamente à criação de empresas que me refiro neste texto, mas à formação que é dada aos jovens no país. Já na segunda década do século 21, insistimos em infantilizar alunos adolescentes, julgando-os inaptos a aprendizagens mais complexas, a fazer escolhas de matérias ou a poderem ser responsabilizados por condutas prejudiciais ao grupo.
Nem sequer deixamos que eles organizem o espaço escolar ou limpem suas carteiras. Ao observar um mutirão de limpeza da Faetec, no Rio de Janeiro, organizado por pais de alunos, uma pergunta não queria calar: os alunos participaram? Em caso positivo, certamente tiveram um aprendizado importante. Outra iniciativa adotada por algumas escolas é organizar assembleias regulares com os alunos, mesmo que ainda muito jovens. Nelas, eles aprendem regras básicas de convivência, discutem melhorias no ambiente escolar e tomam decisões.
Duas outras medidas que podem ajudar o jovem a se tornar autônomo são, por um lado, evitar chamar os pais à escola para discutir disciplina, tratando isso, como ocorre por exemplo na Finlândia, com o próprio aluno, e, por outro, dar-lhe mais flexibilidade na escolha de matérias a serem cursadas. Por que não pensar em eletivas no fundamental dois e no ensino médio?
No ensino médio existirão, na nova proposta, itinerários formativos a serem selecionados pelos alunos, mas não está claro se, dentro delas, especialmente em escolas com jornada ampliada, os alunos poderão escolher que matérias preferem priorizar ou que cursos gostariam de incluir na grade. Isso pode ser pensado, com adaptações, até no fundamental dois. Em ambas as situações cabe à escola promover o protagonismo do jovem, mostrando-lhe seu papel como empreendedor de sua vida escolar, na construção dos seus sonhos, do seu projeto de vida.?
Sempre me questionei se fui o pai que meus filhos desejariam ou precisariam, pois sempre fui muito tolerante, nunca castiguei. Com frequência, eu me lembrava do livro ?Vigiar e Punir? de Michel Foucault. Sempre investi na ideia de que era possível incentivá-los a construírem um mínimopossível de autonomia e responsabilidade nas decisões que tomassem.
O Lucas estava no sexto ano e trouxe uma notificação de uma professora do Nazaré, por não ter feito todo dever de casa. Ele me pediu para não mostrar à mãe dele. Assumi a cumplicidade, mas deixei claro que se viesse outra, eu contaria sobre a anterior. Foi o suficiente. Inclusive, ele nunca ficou de recuperação ou reprovado em alguma série. Da mesma forma, a minha Letícia. Hoje, para nosso orgulho e satisfação eles são universitários em federais e mantêm o veio da autonomia. Precisamos acreditar na capacidade de nossos filhos assumirem responsabilidades desde cedo. Mas, eles precisam perceber que nós realmente acreditamos neles. Para isso, valem os combinados. Eles se sentem levados a sério, antes de tudo como pessoas, depois, como filhos.
José Antônio dos Santos
Mestre pela UFSJ
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Escrito por Educação, no dia 31/03/2017