Recentemente, mencionei o livro ?Escola da Ponte: uma escola pública em debate?. Volto a falar dele, trazendo alguns elementos sobre disciplina dos alunos nessa escola.
Uma brasileira faz a seguinte pergunta sobre indisciplina a uma orientadora educacional (antiga professora) da Ponte: Como tratam uma indisciplina grave? Os pais são comunicados? Participam junto com a escola da decisão a ser tomada? Essa ?indisciplina? é também discutida em Assembleia? A resposta da educadora da Ponte foi: ?A experiência diz que eles aceitam melhor um conselho, um pedido ou mesmo uma ordem vinda de um colega de trabalho, com quem eles se identificam, aceitando-o como legítimo.?
Mas, esta estratégia, por vezes, falha...
Posso partilhar algumas das propostas dadas em Assembleia: fazer o aluno refletir, durante um longo período, nos intervalos do trabalho, fazê-lo acompanhar a Comissão de Ajuda, ajudando-a na resolução de outros conflitos, discutir o seu comportamento na Assembleia, perante todos os colegas, e conversar com os encarregados de educação para intervir, em parceria de forma coerente.
Essas e outras propostas foram discutidas pelos alunos e continuarão a ser tema de debate ao longo do ano, pois, em minha opinião, aqui reside uma das melhores estratégias de intervenção nessa escola: a da discussão aberta e a do debate regular em torno de problemas que, à primeira vista, numa outra escola, seriam relativos a um aluno, mas que na Ponte, se tornam problemas de toda a escola.?
Percebeu leitor? Vale explicar que a Assembleia é composta por estudantes de várias idades, de crianças a adolescentes de 14 anos, que foram escolhidos por votação em dia solene, em processo marcante de organização. E as sessões são muito respeitosas. Assisti a isso de perto. Não dá para descrever o que vi. Em geral, nós infantilizamos as crianças nas suas habilidades e potencialidades. A Comissão de Ajuda também é composta por alunos. Apenas dois deles são indicados pelos educadores. Esse grupo ajuda os colegas a repensarem suas atitudes.
Algo que pode parecer uma invasão de privacidade é o fato de um caso de indisciplina ser tratado abertamente em Assembleia pública. Como educador, sempre avaliei que as atitudes dos alunos que prejudicam o coletivo deveriam mesmo ser publicadas, pois quem prejudica um público já está publicando sua conduta. Portanto, não há nenhuma novidade em tratar publicamente uma ofensa que já se publicou por si mesma ao ofender uma coletividade. Essa coisa de proteger ao máximo a privacidade do ofensor é coisa das ideias liberais burguesas que reforçam o individualismo e supremacia dos abusos individuais sobre os interesses coletivos.
Sempre achei que se as escolas tirassem os estudantes da condição de meros espectadores e os transformassem em atores e protagonistas do seu processo disciplinar, redigindo eles próprios com ajuda dos educadores, que infelizmente não sabem trabalhar em equipe, os meninos e meninas aprenderiam na cidadania e não para a cidadania.
O grande problema é que, o tempo todo, tomamos decisões para nossos alunos e os tornamos incompetentes para construírem liberdade e disciplina. Demonstramos que não conhecemos a capacidade juvenil de assumir compromissos. Mantemos os alunos assistindo a tudo de camarote, como sujeitos menos importantes e achamos que eles não conseguiriam elaborar suas regras coletivas e cobrar um do outro a sua aplicação.
Decidimos por eles e os infantilizamos. Criamos o círculo vicioso de torná-los dependentes, inseguros e indisciplinados para, logo em seguida, reclamarmos deles. As pessoas envolvidas com a educação já perceberam isso e não fazem nada. A maioria deles fala que ama a educação. (Rsrs).
José Antônio dos Santos
Mestre pela UFSJ
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Escrito por Educação, no dia 04/03/2016