As salas de aulas estão cheias. Os professores continuam dando aulas na moda antiga, falando o tempo todo, principalmente nós, da área de humanas. Enquanto isso, técnicos da educação buscam, desesperadamente, construir uma base nacional comum curricular (BNCC), para superar o caos da educação escolar há anos com péssimo desempenho e desastrosos resultados nas avaliações oficiais. Segue continuação da entrevista com o professor Sebastião de Oliveira Pedra, concedida ao Diário de Caratinga.
?Existem modelos semelhantes em outros países. O senhor concorda da forma como a proposta de reforma foi realizada no Brasil? Não seria necessário discutir mais? Sem sombra de dúvidas, há a necessidade de mais discussão sobre a MP 746/2016. Nenhuma reforma funcionará sem um diálogo aprofundado com os atores sociais que estão envolvidos nessa reforma, ou seja, sem dialogar com professores, gestores, estudantes e pais. Em outras palavras, uma reforma do ensino médio precisa levar em conta todos aqueles que estão diretamente envolvidos com o mesmo.
Sobre a possibilidade de sociologia, filosofia, artes e educação física deixarem o currículo obrigatório do ensino médio, o senhor acredita que isso ocorra? A MP 746/2016 recebeu várias emendas e o relatório final, realizados após o debate sobre estas emendas, optou pela permanência das disciplinas de Educação Física e Artes no currículo do Ensino Médio. Portanto, ambas devem ser mantidas. Quanto às disciplinas de Filosofia e Sociologia, o relatório manteve a retirada das mesmas. É uma perda e tanto, pois ambas atuam no sentido de colocar discussões e debates que em outras disciplinas dificilmente podem aparecer. Mesmo em disciplinas da área de Humanas como História e Geografia os temas filosóficos e sociológicos aparecem apenas tangenciando as discussões e não com a mesma forma e a mesma proposta. Logo, perdem os estudantes do Ensino Médio com a ausência dessas disciplinas.
Alguns estudiosos afirmam que proposta poderá levar a uma precarização do ensino, com a ênfase maior em uma formação tecnicista, em oposição a uma formação crítica dos estudantes. O senhor concorda com esta afirmação? Como foi dito acima, a ausência das disciplinas de Filosofia e Sociologia certamente vai diminuir o acesso ao senso crítico e nesse sentido ocorrerá uma precarização da formação dos estudantes. A questão maior é seguinte: a MP 746/2016 mantém uma organização positivista do currículo, ou seja, não abre a possibilidade de um diálogo interdisciplinar, uma vez que impõem como obrigatórias, nos três anos, apenas as disciplinas de Matemática, Português e Inglês e submete as demais disciplinas à aceitação da Base Nacional Curricular Comum (BNCC). O currículo pode até não ficar tecnicista, mas poderá ficar mais empobrecido, o que não é bom.
Como o senhor observa a participação dos professores neste processo? Existe uma necessidade da reformulação do currículo? E quanto às práticas e autonomia do professor em sala de aula? São necessárias também modificações em relação ao modelo de ensino? Mudar a forma de lidar com os estudantes atualmente é tão ou mais importante do que mudar a estrutura curricular. Os professores são formados, no Brasil, em um modelo que não dialoga mais com as necessidades dos estudantes. A estrutura curricular é engessada, é verdade, e acaba determinando a permanência de alguns comportamentos, mas a formação inicial dos professores não oferece muitas alternativas didáticas, pois as Licenciaturas estão mais preocupadas em formar pesquisadores em suas áreas do que professores. Falta, portanto, um diálogo maior entre as Licenciaturas e as Faculdades de Educação.
Uma das propostas é oferecer ao aluno a possibilidade de obter o diploma do ensino técnico junto ao do ensino médio. Ele cursaria um ano e meio de currículo regular e um ano e meio de formação técnica. O senhor vê isso como um avanço ou retrocesso? Por quê? Já vigorou no Brasil um modelo semelhante. A ideia de cursos técnicos profissionalizantes não é essencialmente ruim. O problema é a forma como isso poderá ser feito, pois a MP 746/2016 abre uma possibilidade para que os estagiários sejam tratados como mão de obra barata para as fábricas brasileiras e estrangeiras. Formar para o mercado de trabalho não é negativo, mas formar para uma inserção precária é não somente ruim, como perigoso?.
Cairemos em novos fracassos, se quiserem apenas justapor a BNCC ao velho sistema. E não vejo os professores dispostos a aprender outras práticas e metodologias. O caos está instalado, pelo menos por enquanto.
Disponível na internet, no Diário de Caratinga.
José Antônio dos Santos
Mestre pela UFSJ
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Escrito por Educação, no dia 17/08/2017