André Aristóteles
Pai, educador, pesquisador e
idealizador do Movimento Lafaiete pela Infância
Instagram: @lafaietepelainfancia
Não faz muito tempo que, ao vermos na TV parlamentares falando ao celular em plena reunião, um sentimento de indignação tomava conta da gente. “- Que falta de respeito!”, Era o que muitos diziam. À medida que acidentes e mortes por uso de celulares ao volante viraram questão de saúde pública, campanhas publicitárias foram surgindo, visando a alertar os motoristas. O que essas duas situações têm em comum? Como está a nossa relação com o celular nos tempos atuais? Por que ignoramos a ameaça do celular ao desenvolvimento das nossas crianças?
O que as duas situações acima têm em comum é que não se pode estar inteiro, e com atenção plena e qualificada, se estamos ao celular enquanto participamos de uma reunião ou dirigimos. Na verdade, nunca estamos inteiros se tentamos fazer duas ou mais coisas ao mesmo tempo.
A nossa vida está tão atravessada pelos princípios da máxima eficiência, produtividade e apego ao resultado, próprios do mundo corporativo, que queremos ser produtivos o tempo todo. Estudos revelam que a nossa “Attention Span”, capacidade de ter atenção, está sendo seriamente prejudicada pelo estilo de vida atual, especialmente pelo uso de smartphones e redes sociais. Especialistas em neurologia e psiquiatria afirmam que a tecnologia é o segundo principal fator a impactar nossa capacidade de concentração e memória.
Nos tornamos uma espécie de “sujeito máquina”, nos termos descritos pelos pensadores Michel Foucault, Jacques-Lacan e pelo filósofo sul-coreano contemporâneo Byung-Chul Han, autor do livro A Sociedade do Cansaço. Transformamos o nosso escasso tempo de descanso em mais trabalho e, muitas vezes, um trabalho não remunerado, que ajuda a enriquecer os gigantes da tecnologia. As redes sociais viraram um grande big brother, em que o narcisismo e exibicionismo nos fazem obcecados por nós mesmos. Capturamos o pouco “tempo livre” uns dos outros com postagens da nossa intimidade e de conteúdos que pouco ou nada agregam. Aniquilamos o ócio e o tempo livre; o ‘não fazer nada’. Nos tornamos peças perfeitas da grande engrenagem do sistema capitalista.
Nos tempos atuais, o hábito dos parlamentares de estarem ao celular enquanto participam de suas reuniões parece não nos chocar mais. Estamos todos fazendo a mesma coisa e em diferentes contextos e situações. Será por isso?
Uma família inteira pode ser vista ao celular enquanto engolem suas fatias de pizza numa pizzaria, inclusive crianças de colo. Famílias inteiras ficam ao celular quase o tempo todo dentro de suas próprias casas. Casais estão cada um em seu celular nas mesas de bar.
As pessoas estão ao celular no ponto de ônibus, na caminhada, andando de bicicleta, deitadas, assistindo TV, comendo, tomando banho, numa conversa com os amigos, enquanto cuidam de crianças, durante o trabalho, em sala de aula (não apenas alunos, professores também!), inclusive na hora do yoga e da meditação, enfim, a lista é interminável. Não, não adquirimos esses hábitos na pandemia. Mas foi na pandemia da Covid-19 que esses hábitos foram reforçados.
Não se trata aqui de ignorar o avanço tecnológico e a praticidade que o celular trouxe para nossas vidas. Também não se trata de gerar sentimento de culpa. O celular e os aplicativos são feitos para reprogramar o nosso cérebro e nos viciar. Estamos todos no mesmo barco. Trata-se de convidar todos a olharem com responsabilidade – e não com culpa - para a maneira como estamos nos relacionando com o celular e as redes sociais e os impactos disso em nossa saúde e na vida das nossas crianças.
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Postado por Mariana Carvalho, no dia 08/06/2022 - 07:00