Para um casal de aventureiros lafaietense parecia uma boa ideia vender tudo que tinha e embarcar em uma viagem de volta ao mundo em uma caminhonete Chevrolet 1951 adaptada com quarto e cozinha. O que André de Rezende Jardim, de 42 anos, e Júlia Cristina Magalhães Prates, de 36, não esperavam é que esse sonho seria interrompido por uma pandemia. Depois de sair do Brasil em outubro de 2018, eles passaram pelo Uruguai, Argentina e entraram no Chile, pela Patagônia, no dia 6 de fevereiro. Mas agora, eles se veem presos, sem apoio do Itamaraty e com difícil decisão de deixar para trás a companheira de viagem, que hoje representa todo o patrimônio do casal. Retidos no Chile por causa das restrições de circulação devido ao novo coronavírus, eles receiam voltar e ter o veículo confiscado.
“Chegamos a Santiago em 6 de fevereiro. Para estarmos aqui, além do visto de entrada meu e da Júlia, exigiram também um para o carro. O documento expira em maio”, explicou André. O plano era seguir subindo pela América do Sul, passar pela América Central e ir até o Alasca. Com a pandemia de Covid-19, veio a decisão de interromper a viagem e retornar ao Brasil. Mas, para isso, existem problemas burocráticos, nos quais eles esbarram agora. “Precisamos voltar pela Argentina. Sair do Chile, entrar em território argentino e seguir para Uruguaiana. De lá, retornar para casa. Só que não conseguimos autorização para isso”, comentou.
Para entrar na Argentina, André e Júlia precisam de um salvo conduto e não estão conseguindo a permissão. “Quando estávamos em Santiago, fomos à Embaixada brasileira, mas nos barraram na porta. Uma mulher, que se identificou como sendo o contato da Embaixada, ouviu o nosso problema, mas disse que não poderia fazer nada. O problema maior é que poderíamos voltar ao Brasil, de avião, deixando o carro, mas precisaríamos renovar a licença, o que não conseguimos”, lamenta.
Sem sucesso, decidiram, então, procurar o governo chileno. “Procurei saber o que poderia fazer para deixar o carro. Acontece que, se o deixarmos, ele pode ser confiscado, depois do vencimento da licença, por ser um veículo estrangeiro. Além disso, podem ser emitidas multas”. André tentou uma conversa com o representante da embaixada da Argentina, mas não obteve sucesso. “Eles poderiam dar o salvo conduto de que precisamos, só para cruzar a Argentina. Mas negaram. Pedimos, então, junto ao governo brasileiro, mas eles não nos respondem”, acrescenta.
Como não recebeu nenhum comunicado da embaixada brasileira, ele tomou uma decisão de procurar a Polícia Federal chilena. “É o que nos resta. Ou nos deixam viajar com o carro, retornando com um salvo-conduto, ou renovam a nossa permissão para ficar com o carro aqui. Ela é de três meses e vence em maio. Se for feito isso, voltaremos de avião ao Brasil e depois retornaremos para seguir a viagem. Nossa outra opção é permanecer por aqui, com o carro e, depois que passar tudo isso, retornarmos ao Brasil”, explica. A quarentena no Chile pode ser estendida até meados de junho, o que deixa ele e a mulher apavorados.
No domingo, o Itamaraty se manifestou sobre o caso. “O transporte por terra desde o Chile até o Brasil está severamente prejudicado pelas limitações de locomoção interna que foram impostas pelos governos da Bolívia e da Argentina. São decisões de governos estrangeiros que extrapolam os limites de ação do Consulado em Santiago. Recomendamos aos brasileiros entrarem em contato com o Grupo Especial de Crise para assuntos consulares e migratórios (G-CON), cujo número para casos na América do Sul é +55 61 98260-0767”, diz nota.
André e Júlia reformaram a picape Mary Lou, que pertenceu ao pai de André nos anos 80. O processo para transformá-la em um camper completo levou 2 anos, mas manteve o motor original. A caçamba tem uma área de 6 m², recebeu cobertura acrílica e tem dentro uma cozinha completa com fogão, pia e freezer. O chuveiro é externo, com sistema de aquecimento solar. A cama fica na funcional barraca de teto. E com tudo pronto, já se organizaram para passar 10 anos nessa aventura.
O casal saiu da Nova Globo, patrocinadora da iniciativa, e deu início à expedição, que teria o seguinte roteiro: De Brasília a Ushuaia, na Argentina. De Ushuaia até Prudhoe Bay, no Alaska, passando pela rota pan-americana. Depois de cortarem os Estados Unidos de leste a oeste, chegariam a Vancouver, no Canadá, de onde o casal partiria, de avião, para Vladivostok, na Rússia. Nessa etapa, Mary Lou se separaria da dupla e seguiria de navio, dentro de um contêiner, até desembarcar na Rússia. O casal planejava ‘mochilar’ pela região. E um mês depois, quando a picape chegasse, o casal cortaria a Ásia Central pelas estradas no trajeto da famosa ferrovia transiberiana e atravessar a Europa até chegar a Portugal. De lá, Jardim e Júlia partiriam para Dakar, no Senegal, e seguiriam para a África do Sul, passando pelo Sudeste Asiático e, enfim, terminariam a aventura cruzando todo o litoral da Oceania.
Os dois calculavam levar 3 anos para chegar ao Alaska e outros 7 anos, no mínimo, para concluir a aventura. “Na descida, a Mary Lou chega aos 70 km/h, mas cada quilômetro percorrido vai ser motivo de comemoração”, brinca Jardim. “Acho que por ter essa natureza meio nômade, meio hippie, é que fico tão atraída por colocar a mochila nas costas e viajar. Já essa paixão por carros eu confesso que não tenho. Minha paixão é pela estrada e, lógico, pelo André”, completa Júlia.’
Você está lendo o maior jornal do Alto Paraopeba e um dos maiores do interior de Minas!
Leia e Assine: (31)3763-5987 | (31)98272-3383
Postado por Redação, no dia 20/04/2020 - 13:31